Por que a coleta seletiva ainda é um desafio no Brasil?

Confira um panorama nacional feito sobre o tema com base em pesquisas sobre coleta seletiva nas regiões do país.

Quando falamos de sustentabilidade, é difícil não tocar no assunto “coleta seletiva”. O descarte correto do lixo é um dos temas que permeiam os ODS 11 – Cidades e comunidades sustentáveis e ODS 12 – Consumo e produção responsáveis, os quais tem por alguns de seus objetivos contribuir, até 2030, para cidades com gestões eficientes dos resíduos e padrões mais sustentáveis de produção e consumo.  Para entendermos como contribuir com estes ODS, antes é preciso traçar o panorama do país em que vivemos. No Brasil, a realidade é desafiadora e está bem longe do ideal. Na maioria das cidades, a coleta seletiva é mínima, sendo que apenas 4% dos resíduos sólidos recicláveis conseguem chegar até esse processo de reaproveitamento. A Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe) revelou que este número está quatro vezes menor do que o de países com o mesmo grau de desenvolvimento do Brasil, e, se comparado a um país desenvolvido como a Alemanha, estamos 20 anos atrasados.  Ao adentrar um pouco mais nestes dados, o Panorama dos Resíduos Sólidos 2022 apresentado pela Abrelpe revelou que são gerados diariamente 224 mil toneladas diárias de Resíduos Sólidos Urbanos (RSU). Na prática, é como se cada brasileiro tivesse produzido pouco mais de 1 kg de resíduos por dia. Em termos de região, o Sudeste segue na frente, com 111 mil toneladas de resíduos gerados diariamente. Isso corresponde a quase 50% da geração de RSU do país inteiro. Cada habitante do Sudeste produz uma média de 450 kg de resíduos por ano, sendo São Paulo a cidade que lidera: são mais de 4 milhões de toneladas por ano. Em contrapartida, as regiões com os menores números são o Centro-Oeste e Norte, com 7% do montante nacional.  

Até o momento, deu para perceber que o Brasil gera quantidades gigantescas de resíduos. Mas para onde isso tudo vai e como chega? Bem, ainda segundo o Panorama apresentado pela Abrelpe, em 2022, 76,1 milhões de resíduos foram coletados pelos serviços de limpeza urbana, o que corresponde a uma cobertura de 93% de todos os RSU gerados no país. No que diz respeito ao serviço de coleta, a maior parte do território nacional é atendido, sendo no Sudeste a maior cobertura com 98,60% e no Nordeste a menor, com 82,70%.  

Mas quando o assunto é coleta seletiva – aquela em que precisamos fazer a devida separação dos resíduos a partir do material que eles são feitos a fim de contribuir para o seu reaproveitamento – a história é bem diferente. Em 2021, 75% dos municípios brasileiros apresentaram iniciativas neste sentido. Sul e Sudeste estão à frente, com mais de 90% dos municípios com iniciativas de coleta seletiva, enquanto no Centro-oeste apenas 51,4% dos municípios são atendidos. Importante ressaltar que muitas destas iniciativas são pontuais e não abrangem a totalidade da população dos municípios onde ocorrem. Por isso, tão pouco dos resíduos sólidos recicláveis conseguem concluir o ciclo de reaproveitamento.  

A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) prevê que a coleta seletiva seja uma responsabilidade de cada munícipio, ou seja, como eles disponibilizam este serviço fica a critério de como a gestão municipal o prioriza no plano de desenvolvimento. Outro ponto é o engajamento de cada brasileiro para contribuir com a coleta seletiva: em 2018, uma pesquisa do Ibope revelou que 68% sabem muito pouco ou nada sobre coleta seletiva e 39% não tem interesse em separar o lixo. Em 2019, outro levantamento, desta vez pelo Instituto Ipsos, mostrou que 54% dos brasileiros desconhecem o funcionamento da coleta seletiva em sua região. Também falta conhecimento sobre quais materiais são recicláveis, o que leva o consumidor a separar o lixo erroneamente.   Outro dado que interfere diretamente na gestão eficiente dos resíduos e na coleta seletiva é a destinação final de RSU. Em 2022, 61% do que foi coletado foi encaminhado para aterros sanitários, o que corresponde a 46,4 milhões de toneladas destinados a ambientes adequados. Quase 30 milhões de toneladas ainda são enviadas para lixões e aterros controlados, representando 39% do lixo coletado no país sendo destinado a ambiente inadequado.  
E por que todos estes dados são relevantes? Eles nos ajudam a entender a realidade desafiadora que um país de tamanho continental como o Brasil enfrenta na gestão de resíduos, desde a coleta básica e seletiva até a disposição final. Essas informações refletem a relação estreita da coleta seletiva, reciclagem e sustentabilidade: sem o descarte e destino final adequados, pouco poderá ser reaproveitado. Sem o reaproveitamento, maior o impacto no meio ambiente e em nossas vidas, levando à contaminação do solo, rios, mares e proliferação de doenças.   Diversos fatores tornam difícil o avanço do Brasil neste tema, que vão desde a falta de conscientização do consumidor na hora de separar e descartar os resíduos de maneira seletiva, como também a infraestrutura deficitária das prefeituras no que diz respeito a conduzir os resíduos para um possível reaproveitamento. O Plano Nacional de Resíduos Sólidos (Planares) será uma importante contribuição aos ODS 11 e 12, pois através de diretrizes, estratégias e ações que visam melhorar a gestão de resíduos no Brasil, a meta é encerrar todos os lixões e aumentar a recuperação de resíduos para cerca de 50% em 20 anos. 

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Edição | Ana Wolfe
Reportagem | Nathália Gomes
Infografia e design gráfico | Tayná Gonçalves
Foto de capa |
pexels
*Texto originalmente produzido para o site do projeto Território em Desenvolvimento